domingo, 13 de fevereiro de 2011

Feira livre... demais!

Desde pequena tenho paixão pelas feiras livres, dessas que ficam no meio da rua e vendem vegetais em geral, além de roupas, papel de carta, canetas, utensílios domésticos e o maravilhoso pastel. Quando comecei a trabalhar na Vila Clementino, em São Paulo, troquei o almoço de muitas quintas-feiras por um pastel de feira bem grande e recheado, o que certamente faria os médicos me darem cartão amarelo, se um dia soubessem desse meu hábito. Além do pastel, em si, havia o atrativo de andar entre as bancas, comprar umas frutas fresquinhas, temperos a granel, bolachinhas de nata com goiabada, pechinchando tudo. Nunca podia faltar uma dúzia de umas 14 bananas para a semana. Eu me divertia com os gritos dos feirantes: "mamão, olha o mamão, mamão pra comer com pão, é barato porque dá no mato!". "Olha a melancia, melancia, moça bonita não paga, mas também não leva!".

Aracy, Feira livre

 

Um dia o Kassab, prefeito que nasceu com vocação especial para síndico de prédio e administra, atualmente, o gigantesco condomínio de São Paulo, resolveu botar ordem nas feiras, apoiado pela câmara de vereadores. Agora não se pode mais gritar, as bananas têm que ser vendidas por peso e não por dúzia, e as feiras têm horário para terminar: tudo limpo, impreterivelmente, às 13h. Tive o prazer de ouvir, na semana seguinte à lei de proibição aos gritos dos feirantes, um rapaz berrar: "Olha a goiaba! Goiaba, 5 por 2! O Kassab não deixa eu gritar, mas eu grito assim mesmo!".

Enfim, eu conhecia muito bem as feiras de São Paulo e as de Campinas, que são muito parecidas com as paulistanas. Mas é preciso lembrar que as feiras livres acabam assumindo as características do local onde se encontram, com disponibilidade maior dos produtos regionais. Foi uma percepção imediata, assim que entrei no Mato Grosso, em minha primeira noite de viagem, quando eu caminhava de Aragarças a Barra do Garças.

Bem em frente a uma igreja, próxima à Praça da Maçonaria, havia uma aglomeração de gente e eu, muito curiosa, fui ver o que era. Sorri sozinha quando percebi que se tratava de uma feira livre. Muito interessante: a feira era noturna, ao contrário de todas as que conheço no estado de São Paulo. O que, convenhamos, faz sentido: além de ser um período em que o trânsito é menos intenso, ainda evita o sol, que na região do Mato Grosso é de queimar! As pessoas que estavam lá não pareciam estar apenas providenciando a subsistência da família: a feira era um ponto de encontro. Grupos de amigos formavam rodinhas, com latas de cerveja na mão. Meninas arrumadas passeavam trocando olhares com os rapazes.

De repente, levei um susto: um homem passou ao meu lado segurando duas galinhas mortas, penduradas de ponta-cabeça, pelos pés. Outro passou com uma galinha viva no colo. Logo vi uma barraca de feira com diversas galinhas cacarejantes em gaiolas. Ao contrário das barracas de aves de São Paulo, com balcão resfriado em que só vemos o frango já morto, depenado e em pedaços, de forma que nem nos lembramos que já foi um ser vivo, na feira de Aragarças as galinhas são "de verdade". Havia tanta fruta que eu não conhecia que passei um tempo pegando-as nas mãos, apertando, cheirando e, consquentemente, provocando olhares curiosos dos vendedores e clientes.

Mas não eram só produtos alimentícios que eram vendidos naquela feira: havia também barracas com jogos. Uma delas me chamou a atenção: uma roleta com logotipos de times de futebol e notas de dinheiro em volta. Fiquei observando de longe, enquanto dois meninos que deviam ter entre 10 e 12 anos apostavam. Tentei entender as regras do jogo, mas não consegui. Só fiquei pensando como é que em uma feira no meio da cidade, aos olhos de todos e em frente a uma igreja, poderia haver um jogo de azar envolvendo dinheiro e crianças. Mas para aquela gente, parecia natural.

Fiquei sabendo que a feira, no dia seguinte, iria para Aragarças e, no outro dia, para Pontal do Araguaia. Se eu tivesse ficado mais tempo em Barra do Garças, provavelmente teria ido procurá-la novamente. É em espaços assim que se entende uma cultura.

3 comentários:

Anônimo disse...

Gostei do 'maravilhoso pastel'. Quando era menino, em SP, gostava de comer o pastel com caldo de cana. Nossa, dá água na boca só de falar...

As feiras são realmente interessantes... talvez, em outras cidades do mundo, tal prática original dos feirantes (a de anunciar a viva voz seus produtos para chamar nossa atenção) seria aproveitada como mais uma atração... turística até... por que não?

Tania regina Contreiras disse...

Ah, sempre amei as feiras livres, Gabi, e como cresci em cidades do interior, no Nordeste, sempre foi muito comum as galinhas vivas sendo vendidas fazendo o maior barulho, como que pressentindo que estavam prestes a ir para a panela. Flores, verduras, legumes, farinha, panelas de barro, chouriças, carne seca, patos, roupas, fumo em corda e o pessoal da zona rural vestindo suas roupinhas surrdas, mas bem lavdas e passadas, chapéu de palha na cabeça e um sorrizão banguelo e franco quando recebia o freguês: "Dia, moça!". Amo feiras livres até hoje, mas já não as encontro na capital do mesmo jeitinho que via no interior.
Beijão,

Non je ne regrette rien: Ediney Santana disse...

Feira livre, frutas e tantas outras cores e sabores bons que só a liberdade pode nos trazer alegria