domingo, 22 de julho de 2012

City Tour por Cusco

De última hora, acabamos decidindo fazer o city tour à tarde, o que implicava que teríamos que estar na agência de viagens por volta de 14:20. No hostel, só conseguimos nos acomodar em um quarto mais de 13h, pois os hóspedes anteriores se atrasaram. Foi uma baita correria e acabou que continuamos os quatro sem banho (desde o Acre, desde umas 36h atrás...). Mas e daí? No meio das maravilhas do Peru, banho é mesmo um assunto secundário.

Passo agora para a parte útil aos viajantes: a descrição dos sítios arqueológicos do roteiro do city tour.

Para fazer esse passeio, é preciso ter o boleto de turismo, que pode ser comprado nas agências de turismo ou diretamente em alguns postos de venda espalhados pela cidade. Recomendo comprar o boleto integral, que custa 130 soles (para estrangeiros) e dá direito a visitar, durante uma semana, 16 sítios arqueológicos próximos a Cusco, incluindo os roteiros do city tour e do Vale Sagrado. Acaba saindo mais barato que comprar as entradas para os passeios individualmente. Mais informações sobre boleto turístico aqui.

Sem mais delongas, aqui estão os locais do city tour cusquenho:

1. Catedral de Cusco (entrada não está incluída no boleto de turismo). Como já conhecíamos a Catedral, optamos por encontrar o grupo na saída dela, às 14:20, para continuar o passeio.

2. Qoricancha (entrada também não está incluída no boleto de turismo). Fica na Avenida El Sol, uma das principais do Centro Histórico. Trata-se de um antigo templo inca, demolido e transformado pelos espanhois em templo católico. No caso, virou monastério. Mas ainda se veem as ruínas das construções incas, com o que restou dos templos do sol, das estrelas, do arco-íris. Vou descrever mais detalhes em outro post (aproveitarei para falar do pequeno, mas impressionante museu de Qoricancha).

3. Sacsayhuaman. De todo o roteiro do city tour, esse é o local de que mais gosto. Cusco foi construída pelos incas na forma do animal puma, e Sacsayhuaman seria a cabeça do animal. Fizeram três enormes muralhas de pedra, representando os três mundos: céu, terra e intraterreno. E de lá de cima, se vê a cidade de Cusco, inclusive a Plaza de Armas. Nesse sítio também está a enorme e famosa Pedra de 11 Ângulos. Mais detalhes estão aqui neste post que escrevi quase dois anos atrás.

4. Quenqo. É mais um local sagrado para os incas. Entrando no sítio arqueológico, já se vê uma pedra grande, de formato fálico. Essa pedra, de acordo com o guia turístico, era praticamente um calendário que indicava as estações seca e úmida ao longo do ano. Na foto a seguir, a parte de baixo costumava ter um espelho d'água. Quando a sombra da pedra estava sobre a água, Cusco estava em sua estação úmida. E quando a sombra batia sobre a rocha (à direita na foto), estava na estação seca. Assim, ficava mais simples planejar os ciclos de plantio e colheita, visto que os incas eram grandes agricultores.

A pedra-calendário, cuja sombra indicava as estações

Outra particularidade de Qenqo é uma gruta, dentro da qual se encontra um altar de sacrifício (lhamas eram sacrificadas em datas especiais). De acordo com o guia, essa gruta representa o mundo intraterreno e o animal serpente, que o regia. É possível subir na pedra que cobre a gruta, e então se vêem rochas diferentes, que parecem esponjas. Explicaram-me que essas rochas são vulcânicas, se formaram antes mesmo da separação dos continentes e são do tempo em que aquele local era um grande lago, coberto de água.

As pedras esponjosas e vulcânicas de quando Cusco era um grande lago...

 5. Puka Pukara. Seu nome significa Fortaleza Vermelha. De fato, as paredes são avermelhadas. Dizem que o local tinha funções militares, e que pode ter sido pouso para guerreiros em trânsito. A arquitetura é menos complexa que as que vimos em sítios como Qoricancha ou as paredes próximas a San Blás, que já descrevi. As pedras de Puka Pukara são bem menores e não são esculpidas. A arquitetura mais trabalhada era deixada para os locais sagrados.

Entrada de Puka Pukara, a fortaleza vermelha

6. Tambomachay. Os incas contavam com um ótimo sistema hidráulico, e Tambomachay é repleto de fontes. Dizem que quem bebe dessa água, ou quem lava o rosto com essa água, nunca envelhece. Ditos à parte, parece que pesquisadores constataram que é uma água rica em sais minerais. Atualmente, já não se pode beber, porque também constataram que não é potável. Mas há um cantinho em que conseguimos molhar as mãos e passar a água no rosto, e agora tenho desculpa para ficar sempre com esse meu rostinho maravilhoso de menina de 15 anos rs... Os guias disseram que a cerveja Cusqueña é feita com água de Tambomachay. Verdade ou boato, experimente a Cusqueña, que é boa demais!

As fontes da juventude de Tambomachay

7. Mercado de artesanato. Praticamente todos os passeios, com qualquer agência, envolverão uma paradinha para comprar artesanato. Os guias parecem já ter convênio com os artesãos locais. Geralmente, esses mercados terão preços ligeiramente superiores aos que encontramos nas ruas de Cusco, mas a qualidade das roupas também é, em média, melhor. Os artesãos costumam adorar "regatear", isto é, pechincar. Portanto, não tenha vergonha de sugerir um preço mais baixo. Aproveite para tomar um chazinho de coca na faixa, pois os artesãos costumam oferecer como cortesia aos grupos grandes de turistas.

Gosto muito desse passeio. O único problema é que a guia corria feito doida, tentando cumprir os horários, pois são muitos locais para se visitar em 4h. Quando fiz o city tour em 2010, chegamos em Tambomachay já no escuro e não deu para ver muita coisa. Esse é um defeito que sempre encontro nos passeios com agências de turismo. Sempre que posso, tento ir aos locais por mim mesma, mesmo que para isso eu tenha que pegar transporte público. Pelo menos vejo as coisas com calma. Mas para quem tem pouco tempo, como era nosso caso dessa vez, o city tour vale à pena.

sábado, 21 de julho de 2012

Catedral de Cusco

Logo após o café da manhã, fizemos um passeio pela Catedral de Cusco. O ingresso custa 25 soles por pessoa (cobram metade se você apresentar comprovante de que é estudante. Aceitaram minha carteirinha da USP). Os guias de turismo são opcionais e cobram mais uns 20 a 30 soles. Recomendo fortemente a visita guiada, pois se você for sozinho, perderá muitos detalhes que tornam o passeio ainda mais agradável.

Fachada da Catedral de Cusco

Para entender a importância da catedral, é preciso conhecer um pouquinho da cultura inca e da história do Peru. Os incas tinham uma religião animista, considerando que os elementos da natureza eram deuses. Cultuavam a terra, a água, o arco-íris, o trovão, as estrelas, o sol, a lua... E de repente, os espanhois invadiram e dominaram o império, impondo a cultura católica, que eles acreditavam ser a mais certa.

Como fazer para que aquele povo, de repente, passasse a acreditar que a imagem de um homem morto e pregado numa cruz era seu novo e único Deus? Se eu fosse eles, certamente não acreditaria. E acho que eles, de fato, demoraram para assimilar a ideia. Os espanhois foram se virando como podiam: demoliram os templos de pedra e usaram as pedras para construir igrejas e monastérios em seu lugar. Os altares são cobertos de folhas de ouro e prata, que certamente vieram de objetos incas derretidos. Pegaram os incas que consideraram mais espertinhos e ensinaram a pintar em estilo europeu. Mandavam representar imagens católicas, como forma de ensiná-los a doutrina que, na visão espanhola, era a correta. E assim surgiu a escola cusqueña, estilo artístico que só se vê no Peru.

Mas os incas não esqueceram seus antigos deuses e, à semelhança das religiões afrobrasileiras, fizeram um sincretismo fantástico. Os santos e santas católicos se fundiram com os deuses e deusas incas. Assim, até hoje Nossa Senhora é, para eles, a Pachamama, deusa da terra e da fertilidade, a mais adorada da cultura inca. E por isso mesmo, ela está mais em evidência na Catedral de Cusco do que o próprio Jesus.

Disse o guia que nos acompanhou que é comum que, depois da missa, os católicos se ajoelhem em frente à imagem de Nossa Senhora para orar em silêncio. Enquanto isso, os peruanos mais ligados à cultura inca se sentam e conversam com a mesma imagem, que para eles é a da Pachamama. Conversam em voz alta, como se fosse uma parente ou amiga, ou quem sabe, a própria mãe.

Certamente o guia, de descendência inca, lhe dirá barbaridades sobre os espanhois, sobre como eles destruíram os templos, ídolos e a cultura inca, sobre como mataram homens inocentes. E terá toda a razão.

Fico imaginando o lado dos colonizadores: saíram da Espanha, cruzaram o Oceano Atlântico em caravelas, certamente se imaginavam herois. Vieram trazer o progresso para a América, para as culturas primitivas e atrasadas. Trouxeram a salvação para os pecadores que nunca haviam conhecido Jesus Cristo. Devem ter ido para o céu, pois se doaram para a Pátria e para a Igreja.

Afinal, quantos de nós não impomos nossas opiniões, crenças e costumes aos outros? Ainda mais quando são de outra cultura, aparentemente atrasada? Que dizer de Belomonte, trazendo um suposto progresso ao interior do Pará? Que dizer de nós, quando tentamos convencer nosso amigo ou parente de que ser evangélico / católico / espírita / eubiota / ateu é o caminho certo para a verdade?

Não se pode tirar fotos do interior da Catedral, e pouco se consegue obter pelo Google Images. O negócio é ir lá para ver, sentir e refletir.

quinta-feira, 19 de julho de 2012

As paredes de Cusco

Por volta de 7 e pouco da manhã, decidimos sair da incômoda posição de dormir no sofá do hostel para irmos tomar café da manhã em algum lugar. Deixamos a bagagem guardada no hostel e saímos para o centro histórico de Cusco. Foi um passeio agradável e tranquilo, já que 90% dos turistas certamente ainda dormiam, ou então já estavam em alguma trilha ou passeio bem longe dali.

A caminho de San Blás, um guia turístico nos abordou e começou a dar explicações sobre a pedra de 12 ângulos. É uma pedra que fica num muro construído pelos incas, na calle Ratum Rumiyoc. Essa pedra exemplifica uma característica da arquitetura religiosa inca: tudo se encaixa perfeitamente no todo. É como se cada pedra fosse peça de um grande quebra-cabeças, que deve ser montado sem cimento ou argamassa. E para se encaixar em todo o resto, essa pedra de algumas toneladas foi esculpida de modo a formar um polígono de 12 arestas (e, consequentemente, 12 ângulos).

Pedra de 12 ângulos

O guia também nos mostrou outras maravilhas da cultura inca: uma outra parede em que as pedras formam um puma e uma serpente. Ele disse que, no dia 21 de junho de cada ano (ou seja, no solstício de inverno), às 8h da manhã a luz incide no muro de tal maneira, que o puma fica bem visível. E às 10h, a serpente é que aparece. Cada imagem dura apenas alguns segundos. A parede com essas imagens está na foto abaixo. Desafio vocês a encontrarem a puma e a serpente. Assim que eu voltar para Campinas, pego com minha mãe os postais que compramos, que mostram essa parede no solstício. Posso escanear para mostrar para vocês em um futuro post.

Encontre o puma e a serpente na parede abaixo!


Apenas explicando: os incas consideravam que três animais eram sagrados: o puma, que era o deus da superfície da terra, onde vivemos; o condor, que era o deus do céu; e a serpente, deus do mundo intraterreno, subterrâneo. Assim, a parede representa, no solstício, dois animais sagrados.

O guia também nos levou até outra parede, que foi parcialmente demolida pelos colonizadores espanhois, aparentemente à procura de ouro. Não encontrando nada, resolveram reconstruir a parede, mas claro que não conseguiram fazer nada parecido com o trabalho dos incas. E assim, aquele canto foi usado como cenário para uma das cenas do filme "Diário de motocicleta", em que mostram a Che Guevara o trabalho dos Incas e o trabalho dos "Incapaces", ou seja, dos espanhois.

Ao centro, muro feito pelos incas. Nas laterais, muros feitos pelos "incapaces" espanhois.

Depois de nos explicar tudo isso, claro que o guia pediu sua contribuição financeira. Os guias, por lá, costumam ser universitários que sobrevivem a partir das gorjetas dos turistas. Esse que nos recebeu era estudante da Belas Artes de Cusco e aproveitou para mostrar seus lindos quadros representando a cultura inca. Infelizmente, não tenho dinheiro para comprar obras de artistas que encontro por aí... mas desejo boa sorte ao colega!

Seguimos adiante e encontramos um lugar para tomar um bom café da manhã de ovos mexidos com torrada, e tomamos também nosso primeiro "mate de coca" para espantar o soroche. Agora as coisas subiram de preço, pois Cusco está cheia de turistas internacionais trazendo dólares, euros e reais para inflacionar o mercado. Almoço por 5 soles, não mais!

Continuando o passeio, seguimos para a Catedral de Cusco, que fica para o próximo capítulo.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

De bus cama até Cusco

Por volta de 17h do dia 09/07, embarcamos no bus-cama da empresa Transporte Junior até Cusco. E agora começa a parte escatológica da viagem.

O ônibus era confortável: dois andares, com banheiro, ar condicionado e DVD. Compramos passagem no 1o andar e pegamos poltronas que deitavam quase que 180 graus. As passagens custaram 50 soles, o equivalente a uns 40 reais, o que é bem barato comparado com os preços de passagem no Brasil. Afinal, a viagem de Puerto Maldonado a Cusco envolve uns 500 Km, percorrido em umas 11h, já que teríamos que subir os Andes, de 0m a 3.500m de altitude.

Poucos quilômetros depois de nossa partida, o sol começou a se pôr e concluímos, contentes, que no mesmo dia vimos o sol nascer no Acre e se pôr no Peru.

Pôr do sol no departamento de Madre de Dios, Peru


Dentre os benefícios oferecidos pela Transporte Junior, o ônibus também tinha "terramoza", ou seja, o equivalente a uma aeromoça terrestre. Pouco depois de partirmos, ela usou o microfone para apresentar a empresa, o ônibus, e dar um aviso importantíssimo: "el baño es solo para uso orinario. Repito: solo para orinar!". Completou que para outras necessidades, deveríamos procurá-la, para ela programar com o motorista as próximas paradas. Claro que, nesse ponto do discurso, já estávamos todos chorando de rir.

Por volta de 8 da noite, o ônibus fez sua primeira parada. Costumo ter claustrofobia em banheiro de ônibus, então resolvi descer para fazer xixi. Eu teria me arrependido, se não fosse a experiência surreal que isso me proporcionou.

Na porta do ônibus, aglomeravam-se muitas pessoas. Alguns eram passageiros do ônibus, outros eram vendedores ambulantes. Sim, porque o ônibus parou no meio de uma rua no centro de uma cidadezinha e não havia um posto de gasolina ou restaurante por perto. Então, os vendedores se aglomeravam na porta do busão, oferecendo desesperadamente produtos como: sucos fluorescentes, biscoitos, objetos diversos, água mineral e "pollo con papas", ou seja, frango com batatas.

Assim que consegui passar pela aglomeração, descobri que havia um "baño público" logo à frente. Mas chegando lá, constatei que precisaria pagar 50 centavos pelo xixi, e tive que voltar ao ônibus e passar novamente pela multidão, com o agravante de que agora eu estava na contramão. Muito aperto depois, consegui pegar 50 centavos na minha bolsa e encarei a multidão pela 3a vez. O senhor zelador do "baño" pegou o dinheiro, me deu um pouco de papel higiênico e indicou para eu entrar em um corredor escuro e ir até o fundo.

Fui correndo, porque não sabia a que horas o ônibus iria partir. Os banheiros eram, literalmente, casinhas no fundo de um quintal. Estava tudo muito escuro, não havia iluminação. E ao entrar na casinha, encontrei uma coisa que eu até hoje só tinha visto na região do Mato Grosso: um buraco no chão, com espaço para apoiar os pés. E ao lado, um balde vermelho com uma mangueira ligada, com água corrente transbordando e se derramando pelo buraco abaixo, fazia as vezes de lavatório.

Baño público em alguma cidadezinha do interior do Peru (custa 50 centavos)


Sentindo aquele aroma agradável, fiquei pensando nos meus 50 centavos desperdiçados... Por outro lado, poderia ser pior. Eu poderia ser obrigada a me fechar em uma claustrofóbica cabine de banheiro de ônibus. E assim, decidi fazer valer meus 50 centavos de nuevo sol! Levantei as calças até os joelhos para não arrastar naquela meleca do chão, me abaixei naquela posição de ralar-na-boquinha-da-garrafa que toda menina logo cedo aprende a fazer e tentei mirar o xixi no buraco. Percebendo que era impossível, resolvi simplesmente mirar para não acertar meu próprio pé. E fiquei pensando que, na viagem de volta, eu precisaria levar uma garrafa plástica descartável e um pedaço de cartolina.

Ainda antes de entrar no ônibus, comprei um pollo con papas por 5 soles, atendendo ao pedido do corajoso Daniel. Sim, muito corajoso para enfrentar um frango com batatas, arroz e salada comprado de uma camponesa peruana (as chamadas "collas"), embalado em uma bandejinha de isopor, a bordo de um ônibus com banheiro "solo para uso orinario" (já pensou se o pollo lhe levasse a alguma outra necessidade?!). Mas a fome era tanta que acabei aceitando umas batatinhas e uns pedacinhos de frango, compartilhando desse jantar muito romântico! Ah, tenho de ser justa, até que a comida estava boa.

Pollo con papas comprado de uma colla na parada do bus cama


Enfim, depois dessa incrível aventura, o ônibus não fez mais nenhuma parada (embora a viagem tenha durado ainda umas 7 ou 8 horas), a não ser nos breves momentos em que iria deixar alguém ou pegar um novo passageiro. O banheiro foi ficando cada vez mais fedido e vi umas 3 vezes a terramoza abrir a porta dele e espirrar "bom ar". Passaram uns filminhos de sessão da tarde no DVD, mas o audio estava baixo e em español ligeiro demais para o meu cansaço. Preferi dormir.

Por volta de 4h da manhã, chegamos em Cusco, num frio de doer os ossos. Pegamos um táxi até o hostel, mas chegando lá, ainda não pudemos ir para o nosso quarto, porque a diária começava só meio dia e não havia vagas no momento. Felizmente, os recepcionistas tiveram compaixão e nos deixaram descansar no sofá. Até emprestaram cobertores. E assim, a cena final dessa emocionante aventura de 24h de Rio Branco a Cusco foi registrada pela minha mãe, que estava acomodada com um cobertor na poltrona logo à frente do nosso sofá:


Umas 6h da manhã, no sofá do Hostel The Point

terça-feira, 17 de julho de 2012

De Rio Branco a Puerto Maldonado

Saímos por volta de 5:30 da manhã do dia 09/07 de Rio Branco, de carro. Meu primo se dispôs a nos levar até a fronteira do Acre com o Peru. E assim, saímos de Rio Branco para Assis Brasil, passando por Brasileia, conforme mapa abaixo.

Mapa do Acre


A estrada é a mesma que eu já havia conhecido quando fomos a Cobija, em 2010 (cidade boliviana que faz fronteira com Brasileia). Apesar de cortar a Amazônia, hoje só se veem pastos e agricultura nas margens. Vimos o sol nascer na estrada, o que sempre é uma bela imagem.

Nascer do sol no Acre


Quando chegamos a Brasileia, demos uma passadinha rápida por Cobija (Bolívia) para comprar de alguns acessórios finais que precisaríamos na viagem (darei explicações mais detalhadas em algum post futuro), além de algumas latinhas de cerveja Paceña (nunca encontrei essa cerveja no Brasil).

Depois seguimos para Assis Brasil, que fica perto da tríplice fronteira (Brasil, Peru e Bolívia). Basta passar por uma ponte para chegar ao lado peruano, que se chama Iñapari (pronuncia-se "inhapári"). Passamos pela migração e nos despedimos do meu primo. A partir daí, seguimos de táxi (30 soles por pessoa) até Puerto Maldonado. Foram mais umas 3h de viagem, num percurso de cerca de 250 a 300 Km.

No caminho, vimos uma paisagem parecida com a estrada que seguíamos pelo Brasil. A Amazônia desmatada dava lugar a pastos e campos de agricultura. Mas há algumas diferenças. A principal é que no lado peruano da fronteira, há várias vilas pequenas pelo caminho. Meu irmão (estudante de geografia) foi anotando os nomes no diário de campo e, sem exagero, posso dizer que passamos por uma vila a cada cada 5 minutos de viagem. As casinhas dessas vilas são muito simples, a maioria de madeira ou barro (acho que é o que chamam, no Brasil, de "taipa de pilão").

Uma típica casinha de vilas na estrada que liga Iñapari a Puerto Maldonado


O taxista não ganhou apenas os nossos 120 soles. No caminho, ia pegando pessoas aleatórias, que viajavam no portamalas, ao lado das nossas mochilas, que foram amontoadas num canto. Essas pessoas pareciam ser habitantes das vilas. Faziam sinal para o táxi, que parava para apanhá-los, e desciam em alguma outra vila, quilômetros adiante. Não pareciam estranhar pagar para viajar no portamalas. No total, cinco passageiros viajaram conosco, sendo dois rapazes, um senhor de mais idade (muito simpático) e uma moça com uma criança pequena.

Na estrada, a polícia rodoviária parou o táxi. Minha mãe já imaginou que iriam implicar com o jovem no portamalas, mas não era esse o problema, já que no Peru, que eu saiba, não existem leis de trânsito impedindo transportar pessoas dessa maneira. No fim, só quiseram ver nossos documentos e deram uma olhada rápida em nossas bagagens, apalparam, mas não pediram para abrir mochilas.

Chegando em Puerto Maldonado, o taxista já nos deixou numa agência de ônibus de viagem. Eles cobraram 50 soles por pessoa para a viagem de cerca de 500 Km e onze horas até Cusco, em ônibus leito. Guardaram nossas malas na agência enquanto fomos comer em um restaurante logo ao lado, que cobrou 5 soles por refeição (incluindo uma sopa de entrada e mais um prato principal muito bem servido). Tomamos Inca Cola, uma bebida amarelo-xixi, bem doce. Também foi um jovem de 16 anos, que trabalhava na agência de viagem, que nos ajudou a ir de mototáxi até um local para fazer o câmbio de reais para soles.

Mototáxi, no Peru, é bastante diferente de qualquer coisa que tenhamos no Brasil, como vocês podem ver pela foto. É bastante barato, mas cobram por pessoa. Minha mãe parecia uma criança feliz na sua primeira viagem de mototáxi, quando fomos trocar dinheiro.

Mototáxi, em sua versão peruana, e minha mãe feliz e contente!


Enfim, cerca de 5h da tarde, pegamos o "bus cama" (ônibus leito) até Cusco. E continuarei o relato no próximo post.

sábado, 14 de julho de 2012

De volta ao Acre

Pela 5ª vez na vida, voando para aquele lugar que dizem que não existe. Desta vez, vou acompanhada de minha mãe, que após 29 anos, resolveu fazer uma visitinha para a irmã. Também vão comigo meu irmão Samuel e meu namorido Daniel, que também vão conhecer essas terras distantes pela primeira vez.

O motivo dessa expedição (além da minha natureza de viajante) foi conhecer Rodrigo, filho da minha prima Maria Fernanda, que nasceu há poucos meses. No meio dos preparativos de viagem, surgiu a ideia de aproveitarmos para irmos a Cusco de ônibus, já que estaríamos logo ali do lado, a uns mil quilômetros de distância.

E assim, no dia 07/07/2012, pegamos o avião em São Paulo, rumo a Rio Branco, com escala em Brasília. Chegamos às 2:30 da manhã em horário local (Acre é 1h a menos que São Paulo). A grande surpresa foi quando o piloto do avião anunciou a temperatura: 19 graus. Isso é absolutamente incomum numa terra em que a temperatura “normal” costuma ser uns 30 graus. Desci do avião e bateu um vento gelado. E eu que estava esperando a viagem toda pelo hálito quente e úmido que bate no rosto assim que ponho a cara para fora da aeronave! Bem, esse é o fenômeno da friagem, que acontece umas 2 ou 3 vezes no ano e dura uns poucos dias. Eu já tinha ouvido falar e presenciei pela primeira vez. Mais uma experiência de viagem, mas na boa, prefiro Rio Branco sob 40 graus!

Fomos recebidos no aeroporto pelo meu primo Ricardo, que nos levou para casa, onde já tomamos umas cervejas para comemorar a viagem. Lá para as 5:30 da manhã, fomos dormir. E acordamos umas 10h ao som de uma banda evangélica, que ensaiava no estúdio ao lado do nosso quarto, que também foi improvisado em uma sala de estúdio.

Mesmo dormindo pouco, não sou de ficar mal humorada, principalmente em viagens, principalmente quando antes mesmo de tirar o pijama, já tenho a oportunidade de conhecer meu priminho lindo maravilhoso! O quarto membro da nova geração de primos, todos meninos. Adoro bebês!

Almoçamos uma rabada no tucupi, preparada pela grande Jacinta, que conheci aos 7 anos de idade, na minha primeira viagem ao Acre. O prato me foi apresentado pela prima Maria Fernanda, assim: “carne (rabo, tradicionalmente, mas aqui em casa fazemos com agulha pq é menos gorduroso e tem mais carne); jambu (aquela folha que vai no tacacá); cheiro-verde (vcs chamam de cebolinha); tucupi (é a água da mandioca - chamam aqui de mandipueira); couve e temperos (sal, pimenta de cheiro e etc.).“.*

Sobre a folha que vai no tacacá, tenho a dizer que é bem diferente de qualquer ingrediente que eu já tenha comido em São Paulo. Meio salgada, meio amarguinha, a sua característica principal é o formigamento na boca. Sabe quando você dorme em cima do braço e acorda com ele formigando de manhã? Então, a folha faz isso na língua, no céu da boca, nas bochechas... É ótimo! Mas se você não gostar, tome coca-cola que passa.

Rabada no tucupi



Depois desse almoço típico, saímos para passear pela cidade. Palácio do Governo, Parque da Maternidade, as pontes sobre o Rio Acre, mercado velho. Posso falar desses assuntos em outro momento.

Palácio do Governo do Acre


À noite, festinha de aniversário do primo Ígor, também da nova geração. E vi também os outros priminhos, Vítor e Vivian, que são os caçulas da minha geração.

Pois é, o Acre costuma ser considerado terra que não existe, distante, desconhecida. Mas para mim, em todos os sentidos, é bastante familiar. Me sinto sempre em casa.

Fui dormir umas 22h, bastante cansada, para acordar no outro dia umas 5h e começar a jornada rumo ao Peru. Continuarei nos próximos posts.


*ERRATA: Jacinta foi informada de que foi citada na internet. Mandou corrigir que não vai couve na rabada no tucupi!

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Novas aventuras se aproximam


Primeira vez que estou oficialmente de férias, desde que comecei a oficialmente trabalhar, em 2008.

Não é o intervalo entre sair de um emprego e entrar em outro. Não é aproveitar a viagem para um congresso científico para dar umas voltinhas.

Férias! Depois de um ano e dois meses de trabalho! E vou passear por aí, sem a preocupação com apresentações em seminários ou com a data de me apresentar em um novo emprego.

Acho que estou crescendo...

O que continua igual é a minha característica de gostar de rodar por aí, sem luxo e sem a preocupação de ir, necessariamente, para locais recomendados em guias de turismo. E assim, lá vou eu para o Acre (aquele lugar que nem existe!) pela 5a vez. E lá vou eu para o Peru pela 2a vez, mas agora por terra - o que certamente será uma aventura diferente da que fiz em 2010, chegando em Cusco pelo ar.

 Rota prevista de viagem


Também muda o fato de que, desta vez, tenho três ótimos companheiros de viagem. E assim, se concretizam meus desejos de dois anos atrás, quando eu procurava alguém disposto a viajar em pleno outubro, nesses moldes de mochileiro, e não encontrava ninguém. Viajar sozinha foi um grande aprendizado, e tenho certeza de que viajar em grupo familiar também o será.

Mas chega de escrever, porque a vida está me chamando para sair por aí. Que se concretizem as previsões, e que venham também os imprevistos que levam aos melhores improvisos! Merda* para nós quatro!

*No teatro antigo (e este uso estende-se ainda nos dias de hoje), merda era utilizada na linguagem entre artistas de teatro para desejar boa-sorte antes da entrada em cena. A expressão nasceu da língua francesa, merde, provavelmente no século XIX ou século XX, pelo fato de o público ter acesso à casa teatral por meio de carruagens a cavalos que, muitas vezes, amontoavam fezes em suas entradas; com ironia, a expressão correlacionava o fato de haver "muita merda" na entrada do teatro ao desejo de se ter também "muita sorte" em cena. (http://pt.wikipedia.org/wiki/Merda)