segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Abrindo portas


No início da viagem, houve um episódio que não cheguei a relatar aqui. Foi logo que saí de casa, com a mochila nas costas, cerca de 5:30 da manhã.

Antes de contar, é preciso fazer um preâmbulo: meu prédio não tem portaria. O bloco tem três andares, com uma porta na frente, e cada morador tem a chave dessa porta. Costuma permanecer trancada. Se estiver destrancada, é possível abri-la por dentro, mas por fora ainda é necessário ter chave para entrar.

Saindo do bloco, lembrei-me de que não havia tirado o lixo da cozinha. Voltei para buscá-lo. Como eu estava muito carregada, deixei a mochila na porta do apartamento, peguei o lixo, levei-o para fora e voltei para buscar a mochila. Foi quando percebi que, num ato burro, bati a porta do bloco. Sim, foi uma burrice, porque a chave estava do lado de dentro, pendurada na porta do apartamento. Fiquei trancada para fora do meu próprio prédio, às 5:30 da manhã de um sábado, sendo que eu precisava estar em Cumbica muito em breve.

O que fazer? Acordar um vizinho a essa hora? Eu apanharia, decerto. Fiquei alguns segundos olhando para a porta fechada, chacoalhei-a, encostei nela, falei: "abretecézamo", não adiantou. Foi então que, sem pensar muito, afastei-me um pouco da porta, peguei impulso e bati os ombros com força. Abriu-se! Foi o primeiro obstáculo superado na viagem.

Por que conto agora esse episódio? Porque, de certa forma, ele se repetiu em Águas Calientes.

O pacote que comprei para conhecer Machu Picchu incluía hospedagem em um hotel simples e barato. O guia turístico foi me encontrar por volta das 20h, para combinar como seria a visita ao sítio arqueológico. Manifestei minha vontade de subir Waynapicchu, a montanha mais alta. Ele disse que, nesse caso, seria preciso acordar muito cedo. Waynapicchu tem acesso controlado, podem subir apenas 400 pessoas por dia. Na porta da reserva, ficam alguns funcionários distribuindo carimbos nos tickets de entrada, que dão direito a passar para Waynapicchu. Sem o carimbo, não se pode subir. Assim, os turistas que querem ir à montanha precisam chegar às 6h da manhã, horário em que o parque abre, para conseguir estar entre os primeiros 400. Isso significa chegar no local de onde partem os ônibus para Machu Pichu às 4:30 da madrugada.

Certo. Acordei às 3:45, arrumei as coisas dentro da pequena mala que levei para lá e desci para fazer o checkout. Surpreendeu-me encontrar todo o hotel no escuro, todas as luzes apagadas. Ninguém na recepção. E pior: a porta de entrada estava trancada.

Andei pelo hotel todo acendendo as luzes e fazendo bastante barulho para ver se acordava alguém, mas não adiantou. Estava quase voltando para o quarto, quando pensei: "que diabos, ser impedida de ir a Waynapicchu por causa de uma mísera porta de hotel!". Se ninguém estava lá para abrir a porta para mim, ninguém estava lá para brigar comigo caso eu fizesse o que supostamente não deveria, certo?

Abri as gavetas da mesa da recepção. Havia diversas chaves. Testei uma por uma, não funcionou. Aparentemente, a chave da porta de entrada não estava lá. Comecei a pensar em que janela eu poderia pular, mas então me veio à cabeça o episódio da porta do prédio... Olhei para a fechadura com mais cuidado. Entendi mais ou menos o esquema da lingueta. Com um pouquinho de força e muito jeitinho, destranquei-a! Foi uma sensação ótima ver a porta se abrir e o ar úmido da madrugada entrar na recepção.

A conta do hotel já estava inclusa no pacote, eu não lhes devia nada. A mala, eu poderia deixar no guarda-volumes do parque de Machu Picchu. A chave do quarto, deixei sobre o balcão. Para não ser tão mal educada, ainda arranjei na gaveta da escrivaninha da recepção uma folha de papel e uma caneta, para deixar um bilhete:


Assim, venci mais um obstáculo. E pude comemorar o carimbo "Huaynapicchu" no meu ticket de entrada, como quem comemora um gol do Brasil em copa do mundo.

Contei esse episódio a um peruano que conheci no parque. Mais tarde, quando lhe perguntei se há ladrões em Águas Calientes, ele disse: "sí, ahora hay una que rompe las puertas de los hoteles..."

2 comentários:

Unknown disse...

kkkkkk
morri

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.